Filme de Juan Antonio Bayona, Espanha 2023
Em agosto de 2018 fiz um post sobre o documentário uruguaio A Sociedade da Neve de 2007. De repente, esse post começou a ganhar inúmeros acessos. Isso se deve, evidentemente, à estreia na Netflix do filme homônimo do diretor espanhol Juan Antonio Bayona. Trata-se de um filme de ficção, sobre o mesmo tema. O filme é baseado no livro de Pablo Verci sobre os sobreviventes da queda de um avião nos andes nevados em 1972.
Em 2007, trinta anos depois do acidente, o cineasta Gonzalo Arijon fez um trabalho muito sério com os sobreviventes que resultou no maravilhoso documentário (para ler a resenha clique aqui). Tinha mais de 50 horas de material gravado com os sobreviventes, familiares e demais envolvidos com o acidente. Muito desse material, obviamente, ficou fora do filme. Gonzalo passou esse acervo ao jornalista Pablo Verci para que escrevesse um livro. O filme da Netflix se baseia nesse livro, que se baseou, por sua vez, no material do documentário. As três obras com o mesmo nome.
Um livro e um filme que falam do mesmo tema, um, derivado do outro, é natural que partilhem o mesmo título. Mas dois filmes com o mesmo nome, já é diferente. Ainda mais quando um deles tem muito mais dinheiro e toda uma plataforma internacional por trás de seu lançamento e nem menciona em seus créditos a existência do outro.
Arijon, o diretor uruguaio, comentou em entrevista que está feliz por haver mais um filme sobre o tema e que este filme tenha inclusive sido indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro pela Espanha. Mas o fato de ele ter o mesmo título do seu documentário e não haver nenhuma menção ao documentário nos créditos do filme, se configura, na opinião dele, um ocultamento de sua obra.
Falando do filme em si (o atual, que faz enorme sucesso na Netflix): é um drama do gênero Desastre, com uma pitada de reflexão existencial e um certo aprofundamento psicológico no drama dos personagens que derivam do livro. Mas a dinâmica do filme, o uso de efeitos, principalmente os sonoros, lembra muito os filmes de desastre como Titanic, Inferno na Torre, Volcano, etc. Essas ferramentas são aplicadas em A Sociedade da Neve de maneira muito competente, ainda que espetacular (no sentido do espetáculo), e a luta pela sobrevivência e o retorno dos que não pereceram, geram forte emoção. No entanto, ele não chega aos pés do documentário homônimo, nos questionamentos provocados pelo filme, no processo de construção da nova dinâmica que se estabeleceu na “sociedade da neve” e na emoção/identificação com os sobreviventes.
Acho interessante assistir aos dois filmes, e comparar as linguagens e recursos de cada gênero. Ambos são trabalhos meticulosos no que se propõem em termos de abordagem.
O filme espanhol, pode ser visto na Netflix. O documentário, estava até certo tempo atrás na Amazon Prime, mas ao menos no Brasil, não está mais disponível.
Cabe lembrar que o incidente nos Andes gerou ainda outros filmes, anteriores e posteriores ao documentário uruguaio, o primeiro foi o mexicano Os Sobreviventes dos Andes, o segundo foi o drama norte americano Alive.